Diálogo com o anjo
da retaguarda
Gilson Cavalcante
Um anjo me soprou no ouvido
que as coisas líquidas são
mais fáceis de serem engolidas.
Só me esqueceu de dizer
como lidar com a ausência
e o seu calendário pontiagudo.
Sei que o hálito das manhãs
me enlouquece e esqueço
que sou feito de osso, sangue
e gemido. E grito.
O mesmo anjo ventilou
suas asas em meus olhos
e me tangeu para a vertigem dos abismos.
Quis ele que eu fosse palhaço
e roubou meu sorriso
e me vestiu de andrajos.
Vago, vago por aí
à procura de trapézios
e do conteúdo das coisas adiadas.
A árvore da volúpia
me despiu dos pecados.
Sou a solidão do que esclareço
e nego. O que mais querem de mim
senão a ferrugem do punhal
na jugular do poeta?
Quero uns olhos
emprestados pra chorar.
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